São Paulo — O juiz Ronaldo João Roth é o primeiro magistrado a ser afastado definitivamente do cargo em decorrência de imposturas profissionais, como negligência, em toda a história do Tribunal de Justiça Militar (TJM) de São Paulo. Entre as decisões dele, posteriormente revisadas, está a absolvição de PMs acusados de estupro e tortura.
Em 88 anos, desde a fundação, a Justiça Militar afastou somente dois juízes. O outro caso, porém, ocorreu por questões de saúde, em agosto de 2005.
Ronaldo Roth, antes de ser aposentado compulsoriamente no último dia 10 — por decisão unânime dos desembargadores do TJM –, já estava afastado por dois anos por conta das decisões polêmicas. O desligamento definitivo do juiz foi feito, segundo decisão dos desembargadores, visando a “integridade e a dignidade da magistratura”. Apesar disso, ele continuará recebendo.
Durante o período afastado, Ronaldo Roth respondeu a sete processos administrativos disciplinares que resultaram em uma escalada de penas, iniciadas por quatro advertências, seguidas de uma censura, um afastamento temporário e culminando na aposentadoria compulsória.
Na escala de penas previstas pela Lei Orgânica da Magistratura, somente a demissão supera a aposentadoria compulsória.
Gota d’água
A decisão judicial que culminou no afastamento do magistrado, antes da aposentadoria compulsória, foi a revogação da prisão do cabo Eriki Rodrigo Souza Dias, acusado de corrupção passiva.
O policial militar foi preso suspeito de realizar “diversas e constantes consultas” nas escalas das equipes da Polícia Ambiental, “com o único objetivo de repassar essas informações privilegiadas e totalmente sigilosas […] a pessoas envolvidas com pesca ilegal”, diz trecho de documento do TJM obtido pelo Metrópoles.
Ao todo, o cabo realizou 364 consultas, informando aos infratores, de acordo com o documento, os locais em que as equipes de policiamento ambiental iriam fazer patrulhamento, “evitando, assim, que [os pescadores] fossem autuados ou até mesmo presos”.
Para isso, o cabo Eriki recebia dinheiro, via transferências bancárias. O policial chegou a ficar atrás das grades no Presídio Militar Romão Gomes, na zona norte paulistana, de onde saiu após decisão de Roth.
O polêmico julgamento, no entanto, não foi o único caso controverso na carreira do juiz. Três dias antes do afastamento, Ronaldo Roth absolveu seis policiais militares acusados de amarrar as mãos e os pés de um homem negro que havia furtado chocolates em um mercado, na zona sul paulistana, em junho do ano passado.
A tortura atribuída aos policiais foi registrada em vídeo (assista abaixo). Na época da ocorrência, os PMs foram afastados. O homem acusado de furto ficou cerca de um mês preso.
Para Roth, os cinco soldados e o sargento não agiram com dolo e cumpriram “diretrizes profissionais”. O magistrado ainda reforçou que o uso de amarras por corda, nos casos de imobilização, é uma medida legal prevista na normatização da Polícia Militar de São Paulo.
Estupro em viatura
Ronaldo Roth foi também o juiz responsável pela absolvição dos policiais militares Danilo de Freitas Silva e Anderson Silva da Conceição, ambos acusados de estuprar uma jovem de 19 anos na Praia Grande, litoral sul de São Paulo, em junho de 2019.
Na decisão proferida em 2021, o magistrado reconheceu a relação sexual, porém, afirmou que a vítima “não resistiu” ao ato e que, por isso, a ação não se configuraria como estupro. Além disso, Roth disse que a jovem “nada fez para se ver livre da situação”.
Danilo Silva, então, foi condenado pelo crime de libidinagem ou pederastia em ambiente militar, com pena a ser cumprida em regime aberto. Já Anderson Conceição, que dirigia a viatura no momento do crime, foi absolvido.
A Defensoria Pública apresentou recurso e o TJM revisou a decisão condenando Silva a 16 anos de prisão. Conceição foi sentenciado a sete anos em regime semiaberto. Como revelado pelo Metrópoles, os dois condenados estão atualmente em liberdade.
Em relato, a vítima contou ter pedido ajuda depois de perder o ponto de descida de um ônibus para São Vicente, também no litoral paulista. Os policiais, então, teriam oferecido carona. A mulher foi conduzida a um local deserto, onde o estupro ocorreu.
Com informações do Metrópoles